Deuses de nosso tempo

AUTORIA – Pe. Antonio Rivero
TRADUÇÃO LIVRE – Ammá Maria Ângela de Melo Nicolleti
FONTE – www.es.catholic.net

deuses – que são múltiplos como Deus é um – mudam freqüentemente de cara e de linguagem, procriam-se e inventam novos enganos. São máscaras de Satanás, que tem a propriedade de mimetizar-se e transformar-se como a mentira, já que não está sujeito ao "sim, sim, não, não" da verdade, que é uma só e não se disfarça.

O DEUS-PROGRESSO

Diz a Lumen Gentium, 36: Por conseqüência, devem os fiéis conhecer a natureza íntima e o valor de todas as criaturas, e a sua ordenação para a glória de Deus, ajudando-se uns aos outros, mesmo através das atividades propriamente temporais, a levar uma vida mais santa, para que assim o mundo seja penetrado do espírito de Cristo e, na justiça, na caridade e na paz, atinja mais eficazmente o seu fim. Na realização plena deste dever, os leigos ocupam o lugar mais importante. Por conseguinte, com a sua competência nas matérias profanas, e a sua atuação interiormente elevada pela graça de Cristo, contribuam eficazmente para que os bens criados sejam valorizados pelo trabalho humano, pela técnica e pela cultura para utilidade de todos os homens, sejam melhor distribuídos entre eles e contribuam a seu modo para o progresso de todos na liberdade humana e cristã, em harmonia com o destino que lhes deu o Criador e segundo a iluminação do Verbo. Deste modo, por meio dos membros da Igreja, Cristo iluminará cada vez mais a humanidade inteira com a Sua luz salvadora.

O Credo deste deus é: "Caminhamos num progresso indefinido que não se deterá. Tem havido guerras, genocídios e tragédias espantosas. Porém, estamos progredindo. Tudo o que é progresso é bom, ainda que isto suponha sacrificar o presente em altares de um futuro incerto. O progresso deve ser adorado."

Sem dúvida, os estragos produzidos em Hiroshima, Chernobyl, a guerra química, o auge do ecologismo, a situação de miséria ou a injustiça a que estão submetidas grandes massas de população, a violência sempre constante em algum lugar do mundo... sacudiram fortemente as colunas do progresso, levando, às vezes, desconfiança ao próprio progresso e às suas promessas, e colocando em confronto suas próprias bases filosóficas.

E os povos inteiros que sofrem fome e miséria por causa da guerra, da corrupção, do colonialismo, da usura internacional? E os que não têm acesso à cultura, ao conforto, à tecnologia? Povos inteiros submetidos à escravidão econômica, social, política, psicológica... manipulados pelos ideólogos, pelos tecnocratas, pelas usura internacional.

Portanto, criticamos neste ídolo os seguintes pontos:

Os avanços que alcançam este progresso nem sempre estão de acordo com a ética e a moral, ficam desvinculados delas. A este ídolo interessa a ganância, que chega a ser a prova contundente de sua bondade e acerto. Faz dessa ganância a lei, chegando, assim, o legal (direito positivo) a ser o junto (direito natural). Mais uma vez, não sabe ou não quer distinguir entre direito natural e direito positivo. Preocupa-se com a efetividade, não com a moralidade.

Por trás desta posição, se esconde a influência de Kant (1724-1804) que dizia: o mérito provém do dever e não do bem. E este dever deriva da decisão comum a todos os homens. E, se a decisão comum diz que é preciso esterilizar, estimular as experiências in vitro que nos darão um dia humanóides frios (terrorismo de laboratório encoberto e silencioso), criados sem necessidade de mães, empregar a anticoncepção e o aborto para deter o crescimento demográfico (que cresce de modo geométrico, enquanto que os alimentos crescem aritmeticamente, no dizer de Malthus), legalizar a eutanásia... Então isso é bom. Porém, aqui, o bem não nasce da verdade e a verdade não surge da realidade. O bem para este deus depende do futuro, do projeto do futuro, para onde ele nos conduz.

Este progresso tem poder para romper toda barreira. A técnica e a experimentação lhe dão um cheque em branco para submeter inclusive a intimidade do homem. O deus progresso chama progresso a todo costume novo, por mais sem-vergonha que seja. Por isso, os países mulçumanos depreciam tanto o Ocidente.

O desligamento desse deus é um pecado gravíssimo. Na URSS significava a morte ou o cárcere. No Ocidente, significa a morte civil: exclui-se o sujeito da sociedade, não se o deixa falar nem se lhe dá ouvidos, se o julga sem equanimidade, e se o condena não pelo que faz, mas pelo que pensa e pelo que ele mesmo é. Se for um político, se lhes fecham todos os meios de comunicação. Se for um docente, é perseguido por não estar em dia com as novidades pedagógicas. Se for um dirigente social, é condenado por ser moralista e não por ser prático. Se for um promotor da fé, é marginalizado por estar fora do tempo.

Este deus não pode quebrar essa busca de sobrenaturalidade insaciável da alma humana. Deus está sempre na moda. Porém, esse deus-progresso tenta confundir o povo, proporcionando-lhe deuses em lugar de Deus, religiosidades em lugar de religião, seitas em lugar de Igrejas, opiniões em lugar de fé, mundanismo em lugar de unidade, consolos em lugar de justiça e autêntica paz: fantasmas e reencarnações em lugar de Cristo encarnado no seio de Nossa Senhora. Um exemplo disso é a anedota da morte de Malenkov, aquele chefe soviético do pós-guerra. Estava sendo velado, na presença de altos comandos que foram prestar-lhe homenagem. Nesse momento, diante de todos, para despedir-se, aproximou-se do caixão a viúva, deu-lhe um beijo e fez sobre ele o sinal da cruz, porque Malenkov no último momento de sua vida havia pedido o batismo.

O DEUS-LIBERDADE

Cada homem, diz este deus, tem uma liberdade absoluta. Dessa liberdade brotam os valores. Tudo o que vá contra essa liberdade é anti-sagrado (moral, religião católica com seus dogmas e mandamentos). Não existe o pecado. Não existem limites. A liberdade salva, rege e condena.

Nós dizemos:

Isto é influência da Revolução Francesa, inspirada por sua vez em Rousseau, para quem "o homem nasceu bom, sem pecado original" (in CONTRATO SOCIAL). É influência também de Nietzsche, pai do nacional-socialismo como do bolchevismo, cujo maior terrorismo foi decretar que "Deus está morto" e, como contrapartida lógica, decretar a "inocência dionisíaca dos homens". É como dizer: Deus é culpado e o levamos à guilhotina; e o homem é inocente e o adoramos.

Em nome deste deus, se assassinaram, durante a Revolução Francesa, 250.000 pessoas de uma população de 600.000 pessoas, em 778 paróquias. Na Espanha, durante a guerra civil, destruíram-se 20.000 igrejas, incineraram-se tesouros de arte religiosa, e assassinaram-se 80% dos sacerdotes. Isto, a nível nacional. Na parte "vermelha", 11 bispos e mais de 10.000 sacerdotes. A isto se acrescenta: a profanação de imagens sagradas que logo serviram de tiro ao alvo, os vasos sagrados como urinóis.

Este deus deu à luz ao terrorismo do Sendero Luminoso no Peru, ao de Hitler, ao de Stalin, todos surgidos da mesma raiz iluminista. Outros ainda: assassinatos na Praça de Tianonmen na China Popular; a entrada dos marinheiros no Panamá e a demolição de bairros indefesos hostis aos invasores; o bombardeio seletivo e discriminado de templos (mesquitas e igrejas católicas) e hospitais no Iraque, durante a Guerra do Golfo. Na Bósnia-Herzegovina, os sérvios tiveram mais de 40.000 mulheres violentadas, inclusive monjas.

Como é uma liberdade sem Deus, que se endeusa, está destinada a escravizar e não a libertar.

A liberdade é um desafio e uma responsabilidade. É um fruto que se consegue ganhando as batalhas interiores do domínio próprio e entregando as próprias energias não a fins egoístas, mas a objetivos superiores e generosos.

O DEUS-CIÊNCIA

Assim está escrito no Documento de Puebla 315: "A organização técnico-científica de certos países está gerando uma visão cientificista do homem, cuja vocação é a conquista do universo. Nesta vi­são só se reconhece como verdade o que pode ser demonstrado pela ciência. O próprio homem é re­duzido à sua definição científica. Em nome da ciência justifica-se tudo, até o que constitui uma afronta à, dignidade humana. Simultaneamente se submetem as comunidades nacionais às decisões de um novo poder, a tecnocracia. Uma espécie de engenharia social pode controlar os espaços de liberdade dos indivíduos e instituições, com o ris­co de reduzi-los a meros elementos de cálculo".

E, na Constituição Gaudium et Spes 57: "O progresso hodierno das ciências e das técnicas que, em virtude do seu próprio método, não penetram até às causas últimas das coisas, pode sem dúvida dar aso a certo fenomenismo e agnosticismo, sempre que o método de investigação de que usam estas disciplinas se arvora indevidamente em norma suprema de toda a investigação da verdade. É mesmo de temer que o homem, fiando-se demasiadamente nas descobertas actuais, julgue que se basta a si mesmo e já não procure coisas mais altas".

Seu credo é: somente a ciência nos pode dar certezas, está por cima do bem comum, da ética, da pesoa. Tudo o que não é ciência é sentimento, subjetivismo, espiritualismo.

À deusa ciência corresponde um altar. O bem do homem, a sua consciência, a sua conduta, a sua integridade moral estão debaixo dela.

Isto é o que expressou Roosevelt em 1912: "Creio que a conquista dos países latino-americanos será longa e difícil enquanto esses países continuarem a ser católicos". Na mesma linha, Rockfeller, em 1969, recomendou em Roma que substituísse os católicos da América Latina por outros cristãos, recomendação que está em andamento com ingentes recursos de toda ordem. Tendência associada com o controle da natalidade e com a política monetarista do FMI.

Nós dizemos:

Há aqui a influência de Comte e de Kant que diziam haver uma separação absoluta e irredutível entre os sentimentos e os fatos. Aos primeiros – dizem – corresponde o mundo subjetivo; aos segundos, o objetivo, experimentável, cientifico. Se isso fosse verdade, teríamos que eliminar o mistério que todo homem traz consigo.

Existe um reducionismo científico. Entende-se que o conhecimento verdadeiro é somente conhecimento do experimentável ou do mensurável. Nega-se à inteligência a capacidade de se colocar em contato com o que não está sujeito a ela nem é mensurável; ela é reduzida à capacidade de conhecer apenas o quantitativo.

Há um reducionismo do homem, de suas capacidades espirituais, de sua racionalidade.

Há que se dizer também que a fé não se coloca contra a razão nem contra a ciência. Portanto, a ciência se converte em ídolo e em sua soberba quer ocupar tudo quando abandona a sua missão de instrumento e pretende ditar leis ao próprio Deus. É o momento em que cai de seu pedestal e se arrebenta.

O DEUS-HOMEM

Assim escreveu o Papa Paulo VI: "A religião do Deus que Se fez homem se encontrou com a religião do homem que se faz deus".

O seu credo é: o homem é imanentista, total e completo em si mesmo. Nada está sobre ele. Ele é a medida de todas as coisas. Seu prazer, seu ter, seu "eu", marcam sua lei. Ele é o princípio supremo da lei. Deus é válido na medida em que o serve.

Nós, porém, dizemos:

Aqui, o homem perdeu sua condição de criatura. Estamos retornando a Feuerbach (1804-1872).

Aqui, Deus é suprimido, a sua graça é suprimida. O homem consegue tudo com suas forças, inclusive em coisas espirituais. Daí, o yoga, o controle mental e a meditação transcendental para a experiência mística. Já não é Deus que Se dá, mas sim o esforço humano que quer conseguir tudo, inclusive chegar a Deus.

Aqui, o homem diz a Cristo que desça da cruz, que não necessita se sacrificar. Pregam uma religiosidade de consumo, superficial e demagógica. Pregam que virá uma nova era, a do Aquário, pelo ano 2.140, onde o mestre, a reencarnação de Cristo, ensinará aos homens a se salvarem por si mesmos.

O DEUS-UTILIDADE

A lei é: o útil é bom. A eficiência como cartão principal de apresentação. O homem, como material humano, medido pelo rendimento (marxismo, capitalismo liberal). Utilitarismo e pragmatismo.

Nosso juízo a respeito:

Nada de sentido heróico da vida. Nada que não seja para conseguir algo prático. Nada de poesia, de arte, de contemplação e oração. Quaisquer destas coisas, sim, se me trouxerem benefício. Se, através da contemplação, vai me curar do estresse, bem-vinda!

Pelo utilitarismo atual, e sob a proteção do deus-ciência, chegamos a uma civilização da morte.

Exalta o hedonismo, o uso de droga para conectarmos com o infinito.

Em nome deste deus, sacrifica-se a muitas aberrações: justificam-se a esterilização de enfermos mentais, como fez o Parlamento Europeu, ou o suicídio voluntario, ou por decisão da família dos enfermos, como na Holanda.

Este ídolo é barato e chato. Somente sociedades decadentes, que perderam suas aspirações, estão em condições de aceitá-lo para reger suas vidas. Porém, o homem é um ser chamado às mais íngremes alturas e, por isso mesmo, está também propenso a cair nos mais profundos abismos.

ALGUNS SUB-DEUSES

DEMOCRACIA LIBERAL – É um engano de democracia. O povo vota e aí terminam as suas atribuições. É um zero à esquerda. Anula-se o poder das sociedades intermediárias, que são as encarregadas de tecer a rede de relações sociais que torna forte uma nação. Acusam-se as sociedades intermediárias ou os centros de força de serem "corporações", que, por sua natureza, produzem tirania, governos de direita, autoritarismo. Sociedades que são: igrejas, sindicatos, universidades, forças armadas, municípios, federações de comércio, agrárias ou de indústrias, sociedades beneficentes, clubes.

PAZ – Paz como não-guerra ou não-conflito e não como fruto da justiça.

VIDA – Em forma de hedonismo. Viver e gozar a vida: sexo livre, droga, usura... O que dizer dos mártires que sacrificaram suas vidas por causas superiores, ou a consomem diariamente pelos demais? A vida não é o supremo. Há coisas superiores. Há outra vida. Sem um sadio desprezo pela vida, nos convertemos em pouco menos que vermes. Uma vida digna é a vida que se põe a serviço do que está acima da vida. A vida melhor vivida é a que aparentemente se perde. Não há maior glória que dá-la por aquEle que a transcende.

MODA – É o mais estúpido dos ídolos. Porém, por sua aparência alegre e inofensiva, é talvez aquele que mais tem seguidores. É fanático e dogmático. Quem não faz caso da moda é marginalizado da sociedade. É ídolo irracional e imposto, porém funciona. Está relacionado com o deus-progresso. Por trás deste ídolo, se esconde a concepção evolucionista, relativista e historicista da vida. Nega a verdade objetiva, a estabilidade da natureza, os princípios irredutíveis da moral. Inclusive, nega que a natureza humana seja algo acabado e proclama que é dependente das transformações sociais (por isso, muitas vezes, está nas mãos de pessoas sexualmente promíscuas, ambíguas ou mutáveis). Nega a capacidade do homem de definir, porque definir é a negação da evolução e do progresso. Nega a capacidade do homem para conhecer as essências, pois, uma coisa que ontem era, hoje não é. Por isso, nós, homens, devemos permanecer livres inclusive da própria natureza humana, da moral, dos princípios, e adaptar-nos às mudanças, aceitá-los e assumi-los porque não há alternativa. A moda se estabelece sobre a base de um anonimato. Segue-se uma força cega, porém onipotente, satânica destruição das coisas, da própria criação, de Deus.

AMOR – É um idolozinho do deus-liberdade absoluta. Total culto ao corpo, pregado a partir do púlpito de Hollywood. Amor de sentimento, à primeira vista. Amor que permite a infidelidade, o divórcio: "Já não sinto nada pelo outro, não devo fingir... portanto, devo me separar". Já não é dar-se, mas sentir e gozar e abusar do outro. Amor passageiro, pois os sentimentos são passageiros. Amor como "sexopatia". É um amor mendicante que se contenta com migalhas, que nunca está seguro, que não sabe aonde vai, que sofre muito e trata constantemente de calar esse gemido interior com novas experiências que trazem um analgésico cada vez mais passageiro e que aumenta o desespero. Digamos que o homem foi feito para amar. Não meramente para sentir amor. Feito para o matrimônio, para a família, os filhos, a estabilidade, a velhice serena e confiante. Não para aventuras, para a infinita e estúpida vaidade, para a insegurança e a imaturidade constante.

CONCLUSÃO – Hoje, nós nos comportamos como pagãos, adorando ídolos (Is 30, 1-5). Ídolos que são máscaras do próprio Satanás. Estes ídolos têm sido chamados também de modernismo, secularismo, humanismo ateu. Com estes ídolos não podemos construir a cidade de Deus, a civilização do amor. É-nos exigida uma verdadeira cruzada.